"O homem mais feliz do mundo poderia usar o Espelho de Ojesed como um espelho normal, ou seja, ele olharia e se veria exatamente como é, [...] ele mostra-nos nada mais nem menos do que o desejo mais íntimo, mais desesperado de nossos corações[...]
Porém, o espelho não nos dá nem o conhecimento nem a verdade. Já houve homens que definharam diante dele, fascinados pelo que viram, ou enlouqueceram sem saber se o que o espelho mostrava era real ou sequer possível[...]Peço que não volte a procurá-lo. Não faz bem viver sonhando e se esquecer de viver[...]"

(J.K. Rowling)

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

(________)



- Porque não cabe mais o silêncio.
Já não cabe mais a espera
Sorrir? - quem me dera.
Sorrir foge ao senso de nosso comisso.
Ora, o que posso eu querer além disso?
Um amor de infante prazer,
Viver e (um pouco) a cada dia morrer,
Ou mesmo ilícito compromisso?
Muito bem, que não posso
Se hoje ao ilógico sentimento nosso
Só resta o gosto da ausência mórbida,
A insensatez das saudades rábidas
E o confuso desejo de cuidado.
Resta o calor do beijo remisso
A dor do cuidado omisso
E o cheiro do perfume suado.
Sorrir? - quem me dera
Mas foge às razões de nossa busca esmera
Agraciar-se da própria miséria encrustada;
Foge à essência das respostas sinceras
Mascarar delírios de lacerada quimera
Esvair-se no todo,
No tudo
E no nada.
Esvair-se no ufanismo do esperado momento
Na natureza afásica do sentimento;
Perder a destreza,
A beleza
E a leveza
Da palavra falada.
- Porque já não penso em resposta pronta.
Não me valho
Como ser falho
Do tempo e da inspiração;
Se tal jugo me amedronta?
(Que afronta!)
No fim das contas,
Volúveis em demasia me são.
Sim! - É o fundo do poço!
E agora
No correr da hora
Por este moço
Imerso até o pescoço,
- Perdido em meu próprio alvoroço -
Estou neste nosso problema.
Vazio,
Sem nada,
Sem título
como esse poema.
Como este esquálido e inébrio poema.

Rafael Casal / 30 de Novembro de 2009



sábado, 14 de novembro de 2009

R = {x | x ≠ x}

Desde o início avisei para não tentar adivinhar nem prever meus interesses. Eles são múltiplos. Divisores. Únicos. Vazios.

Não tente entender a lógica das minhas proposições. Elas não podem ser classificadas como verdadeiras ou falsas. Sequer são sentenças. São interesses não consultáveis em tabelas-verdade. Não respeitam relações de equivalência ou mesmo de implicação. São, em suma, declarações sinceras de negação.Conectivos? Não me são de grande valia. A conjunção me é pragmática. A disjunção, evasiva. Confesso, entretanto, a minha simpatia por condicionais. Elas me dão possibilidades. Verdades falsas e Falsidades verdadeiras. Tê-las me é conveniente. Satisfazem as minhas necessidades. Preenchem meu conjunto solução.

Não se permita acreditar nos elementos próprios de minhas vontades. Muito obviamente, são interesses de pertinências mutáveis. Não pensastes mesmo que pudesse ser diferente, creio eu. Mas por via de suposições, deixei claro que não me restrinjo a um conjunto unitário. Não sigo descrições nem leis. Nada de citações ou propriedades. Apenas variações acíclicas entre o −∞ e o +∞.

Não procure respostas em igualdades ou inclusões. O todo não reflete as partes. E as partes juntas, são maiores que o todo. Cruzar informações nunca é de bom resultado. Meu sistema operacional dispensa ineterseções. Vontade e ação? - quase sempre, são conjuntos disjuntos.

Renego os complementares e atraído me sinto pelas diferenças.

Nada a falar sobre as uniões.

Não tente imaginar meus interesses mais íntimos. Eles são Naturais. Neles me perco diariamente. Redesenho-me de forma associativa, seja somando ou multiplicando, e me mantenho reservado em comutativas de adição e produto. Tudo para fugir do elemento neutro (seja ele o nada ou a unidade). São próprios de minha natureza humana. São sentidos de necessidade.

Não tente dimensionar meus interesses mais crus. Eles são Inteiros. Fracioná-los? - Não me faça rir. Mas não são inteiros apenas por sua completude irredutível. Guardam em si a natureza oposta e simétrica dos meus sonhos. E neles eu me reinvento sempre que necessário. Sempre que me vejo desporvido de quocientes e abarrotado de dividendos.

Contemplo, de certo, invariáveis interesses Racionais. Mas sobre eles não tenho muito a falar. São os pontos em que me perco e me traio. Porque eles prescrevem meus passos. Quanto a tais intenções, não tenho qualquer recomendação. Apenas a de que não perca seu tempo ou juízo com elas. Não vale à pena, ora pois. São Racionais. Precisa dizer algo mais?

Apenas Racionais.

(...)

Não se prenda à loucura de minhas ânsias. Elas são Irracionais. Não te cabe entendê-las. Elas se estruturam em razões paralelas que não nos contém e em planos inversos que não alcançamos. Segue uma lógica sem períodos e proposições incoerentes. Produtos de potências incapacitantes e racionalizações imprudentes. Delas tome apenas a insanidade que me é desejada no momento do amor.

Não se engane com a blandície dos meus interesses mais histéricos. Eles são Reais. E não duvide disso. Eles me mantêm vivo. Por mais loucos que pareçam ser. São tão naturais que podem ser racionais. E tão inteiros que podem ser irracionais. Logo assim, sujeito às facetas volúveis da natureza motivadora, eu me vejo sempre perdido nas linhas tortuosas de meu próprio afã e entregue aos delírios insípidos de minhas ausências.

Sabendo que todas são, de igual forma, Reais.

E não tenha medo, por fim, dos meus desejos mais insanos. Sim! Eles são Complexos. E assim o são por sua própria natureza compensatória. Porque não me cabe que não o sejam. Porque, invariavelmente, existem para dilascerar a tolice e a brandura das inapetências. Não os compreendo muito. Mas muito também é o sofrimento encrustado nos extremos de seu vazio. Não tê-los? - Sequer posso imaginar.

Desde o início avisei para não tentar adivinhar nem prever meus interesses. Não existem regras ou quaisquer parâmetros. Apenas possibilidades. Não se perca em restrições. Elas não funcionam. As mais imediatas, são por definição, obsoletas. Nada de restrições, por favor. Acredita mesmo que minhas vontades são tão limitadas?

Não se perca em pontos específicos, porque cada escolha é um intervalo e infinitas são as razões ilógicas que as tornam válida. E por tal certeza é que permaneço tranquilo. Por tal sentença, permito-me o descanso.

Porque tenho a paz e a leveza da variância. A mutabilidade que faz da sinceridade e da intuição meus íntimos subconjuntos

E da Liberdade o meu conjunto Universo.

Rafael Casal / 14 de Novembro de 2009

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

O monstro do estômago



Outra vez? Ora, pois que ele está acordando. Mas tinha que ser de tão umbrosa vontade?

- Irrequieta pergunta a se fazer -

Sim, ele está acordando.
Já posso ouvir os rugidos do seu despertar. Já posso sentir o seu movimento e suas garras a arranhar-me as entranhas. De que me valeria agora entoar qualquer canção de ninar? - De nada, muito obviamente.
Foi-se o sono e a paz. Foi-se a tranquilidade do nada. A leveza da ausência.
Ele está acordando.
Fato.
Ponto.

(E agora preparar-me-ei para tal momento)

Ele está acordando.
Não por quem, outrora, despertara. Não por quem, há tempos, rasgara-me o juízo e corroera-me a sanidade. Mas é a mesma ânsia de vida. De liberdade. A mesma vontade louca de explodir sua prisão ácida e ganhar o vácuo das linhas tênues do universo próprio de mim. A ânsia de sufocar-se em seus instintos mais grotescos e planar por entre os símbolos ilógicos de suas íntimas fugas.

(A mesma necessidade de si mesmo).

O que tinha eu a fazer face a tão invasivo levantar? - Apenas o que de certo continha a minha capacidade incipiente: Observei os fatos. Filtrei as certezas. (Desprezei as absolutas e retive as infundadas). E a tal convicção entreguei-me: Ele está acordando. Mas necessito fazer um breve esclarescimento acerca: Trata-se de desejos da mesma natureza e de intensidades díspares. A mesma ânsia em graus distintos de insanidade. - O rodízio de posições permanece constante. Muda-se o objeto e a capacidade deste de causar respostas espásticas, mas persiste a essência da razão motivadora.

Ele está acordando.
Posso sentir seu bafo quente e fétido a irritar-me a mucosa. Cheio de seus costumes histéricos e intempestividade requerida. Ele se move. Remexe-se sobre suas próprias dúvidas e inquietudes. Ele se retorce sobre si mesmo, agônico a cada palavra. Contrai-se a cada simples lembrança, como um corpo às vésperas de um ataque tetânico. Basta a voz. A imagem. Ou o toque. E lá está ele, a inchar-se de sede e fome de vazio.

A voz.
A imagem.
Ou o toque.

E lá está ele a avisar-me que muito em breve serei outra vez abrigo de um universo que não cabe em mim. A avisar-me que ele está quase em vigília e que a insônia (outra vez) é o que me resta.

A voz.
A imagem.
Ou o toque.

E lá está ele a avisar-me que muito em breve serei apenas ácido e restos de mucosa sangrando.
Ácido e restos de mucosa sangrando.


Rafael Casal / 02 de Novembro de 2009