"O homem mais feliz do mundo poderia usar o Espelho de Ojesed como um espelho normal, ou seja, ele olharia e se veria exatamente como é, [...] ele mostra-nos nada mais nem menos do que o desejo mais íntimo, mais desesperado de nossos corações[...]
Porém, o espelho não nos dá nem o conhecimento nem a verdade. Já houve homens que definharam diante dele, fascinados pelo que viram, ou enlouqueceram sem saber se o que o espelho mostrava era real ou sequer possível[...]Peço que não volte a procurá-lo. Não faz bem viver sonhando e se esquecer de viver[...]"

(J.K. Rowling)

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Interjeições desconexas

Já faz dias que venho tentando organizar as palavras. Obviamente, sem muito sucesso.

E a sensação ubíqua é a de que tenho sido engolido pelo correr das horas. As palavras são muitas. As vontades também. Quanto às saudades, eu já nem falo. Tenho todos os subsídios mentais e físicos de que preciso para me perder em frases de efeito e textos longos bem elaborados.

Mas, simplesmente, não consigo mais escrever.

Não me pergunte por quê. Eu não tenho pensado muito acerca, e por tal motivo, não saberia responder de forma definitiva. Sim, não tenho pensado muito. Em nada, para falar a verdade. Não por falta de vontade, ou mesmo por falta de estímulo.

É preguiça.

Sim, preguiça. De pensar, de escrever, de futucar o que parece já estar morto em mim. De sair do confortável estado de esquecimento (ou pelo menos do dito e transfigurado esquecimento). Preguiça de lembrar, de organizar.

Preguiça de existir.

E é por isso que tenho esta sensação de que tudo está se empurrando. As coisas estão acontecendo, e eu pareço estar sendo arrastado pelo fluxo natural da existência. Caminhando apenas. Como nunca tinha feito antes. Como nunca tinha me permitido antes.

O que, de certo, mais me assusta é que eu estou bem, por mais que possa não parecer. Já não sei mais chorar. Trago aos lábios risos largos e contínuos. Ando me divertindo com pouca coisa. Tenho me importado menos e me preocupado bem pouco. Com tudo. Aliás, com nada. Estou perseguindo os ponteiros do relógio. E sabe por quê? - A preguiça tem me dado um conforto que já não lembrava - para não dizer, não conhecia. Está tudo muito sereno, muito tranquilo. Em paz, se é que esta é a melhor denominação para tal estado.

Claro que se trata de uma condição perigosa, pois estou começando a descobrir que ainda não sei conviver com tanta calma e aconchego. Porque as palavras se desorganizam, perdem-se em seus próprios significados. Como se não precisassem ser postas em ordem, como se tudo pudesse simplesmente permanecer sem leis ou regras bem definidas (ou mesmo mal estabelecidas). Como se tudo não tivesse um sentido além do medíocre fato de existir.

É o estado do "não se importar".

O estado do não-sofrer, do não-sentir, do não-pensar, e por extensão, do não-viver.

Começo a me sentir um jovem rabugento, porque durante muito tempo o que eu mais desejei foi conseguir não me preocupar, não me importar, não me irritar, não me envolver e todos os verbos mais relacionados. E agora, indubitavelmente, começo a considerar tudo isso muito vazio. Começo achar que tudo isso é o Nada (com N maiúsculo), ora tão desejado, ora tão temido.

O pior de tudo (ou melhor, confesso já não saber): quando enfim consegui, estou seguro em dizer - Ser feliz é muito cômodo (para não dizer chato, pois prefiro ainda não adjetivar dessa forma).

E, para falar a bem dita verdade, eu não sei se quero mais tanta falta do que falar.


Rafael Casal / 24 de Maio de 2010
(Parte I de "Confissões pouco trabalhadas")

Um comentário:

  1. As vezes nos pegamos falando, confessando e já não cansamos de falar sobre a mesma coisa. Esse hábito se torna necessário. E a gente só fala de felicidade. No fim dessas confissões trabalhadas, você nos revelará uma boa notícia.

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